quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Prólogo – 1981

       Como era costume, todos os anos haviam uma festa de família. Pessoas que não se encontravam há anos escolhiam aquele dia para poder remediar a escolha que tinham feito de se afastarem da família; uma multidão de pessoas que sabem de mim desde que nasci, mas que raramente me falaram. O ambiente não é hostil, mas sim estranho [sinonimo], e não conduz com a boa disposição do sol. A minha família deve ser de Inverno, pensei eu.
       E mesmo passado apenas um ano, se dissesse que ninguém envelheceu, estaria a mentir, porque pelo contrário, todos me parecem cada vez mais velhos.
      Vêem-se avós, tios, primos muitíssimos afastados, e pergunta-se sempre: “Tem passado bem?”, “Então e como tem passado a sua vida?” ou “E a mulher não pôde vir porquê?”. Muitas vezes não passaram bem porque a ex-mulher os abandonou e tiveram uma depressão, outras, estão muito bem, porque receberam uma promoção.
      É engraçado ver os velhos a confraternizar com adultos, tentado meter se na vida deles, enquanto que os adultos só se querem meter com os adultos, e claro, as crianças ficam a um cantinho, todas juntas, e mesmo assim, divertem-se ainda mais que alguns dos adultos.
      O programa para as crianças é um pouco diferente do dos adultos; enquanto estes conversam uns com os outros, elas brincam, com primos que não vêem há mais de um ano, mas que ao contrário dos adultos, estas são pessoas por que esperam ansiosamente todo o ano. Há um cão rafeiro (que na minha opinião, por ter nome, origem e destino desconhecido, chamaram-lhe isso mesmo, Desconhecido) com que toda a gente pequena brinca, apesar dos constantes e sérios avisos das avós e tias de que podemos apanhar pulgas; depois vamos para a mata ver as cabras que la estão presas. Parece que desta maneira, não nos é ocupado muito tempo, mas lembrem-se que uma criança consegue sempre ocupar o seu tempo.
      E claro, há ainda o grande almoço, em que toda a gente traz um pequeno contributo; se for uma dona de casa muito prendada, trará o seu melhor doce ou melhor petisco, mas se for como por exemplo, a Tia Graça de Lisboa, não se dará a tanto trabalho e trará novidades comestíveis lá da Capital, para as crianças é normalmente gomas. Enquanto as mulheres estão todas a participar numa maratona entre a cozinha e a sala, para levarem as coisas rapidamente para a mesa, os homens ficam ao ar livre, cantando fados e grelhando a carne que será servida ao almoço, juntamente com as novas batatas fritas de sabor a tutti frutti.
       Estando já tudo preparado, as crianças são chamadas para a sua mesa, enquanto que minha mãe me chama à parte e anuncia-me que desta vez ficarei na mesa dos adultos e que sou demasiado crescida para tanta algazarra. Minha mãe é uma das pessoas mais rígidas que conheci, nos meus dez (longos) anos de vida. E não sei porquê, mas acha-me diferente das outras crianças, mais adulta e responsável que elas. Se queria ir para a mesa dos adultos? Não, mas podia experimentar… Minha mãe sempre tinha razão, dizia-lhe o meu pai.
       Sentada à mesa, uma mesa muito velha, que parecia muito frágil, minhas mãe decide mudar-me de lugar e põe-me entre duas tias que jurava nunca tinha visto na minha vida, mas que diziam conhecer me melhor que eu própria. Claro que comecei a desejar dali sair, ir ter com as outras crianças da minha idade, mas tinha que seguir as ordens da mãe.
      -Já está tão crescida! Tem quantos anos a menina? Oito? – Pergunta-me a tia Amélia, uma pessoa que de tão velha e de tantas pessoas ver morrer, a cabeça dela já não era o que era dantes…
      -Dez – respondi eu – e a senhora? Cem?
     -Uh! Que miúda mais mal-educada! – Consegui concretizar o meu plano, agora indignada, não falaria comigo o resto da refeição.
      -Não ligues a tia Amélia, que ela está tótó da cabeça. Diz-me, já és muito crescida para a tua idade… Foi por isso que a tua mãe te pôs na mesa dos adultos? – Quem desta vez falava era uma mulher de vinte e tal anos, que não me lembro de alguma vez a ter visto. Estava a minha frente, e devia ser vegetariana, porque enquanto toda a gente comia selvagemente as costeletas, ela olhava-os com desdém, penicando apenas o arroz que tinha no prato.
     -Eu não sou criança. Já li o Moby Dick – Indignada estava eu agora.
      E só agora reparava que ela era muito magra e tinha os olhos muito saídos das órbitas.
      -Queres que te trate como um adulto então? – Ela olhava-me fixamente, e apesar dos seus olhos parecerem mortos, algo neles brilhava, como uma réstia de esperança; uns olhos esbugalhados avançavam para mim, enquanto me indicavam para sair da mesa.
     Ninguém reparou que saímos da mesa, da mesma maneira que eu nunca tinha reparado nos outros encontros da família naquela personagem desconhecida. Aproximámo-nos de uma árvore e reparei que ela estava cansada, só por ter andado uns 100 metros, por isso sentou-se e começou a arfar.
     -Sabes Liliana, ninguém é o que tu pensas que é. Todos acabam por se tornar monstros, e nada podes para controlar isso.
      Naquele momento, debaixo daquela árvore, senti como se sempre a tivesse conhecido, que era amiga dela, por isso arranjei coragem para lhe perguntar porque parecia tão doente.
     -Na universidade conheci um rapaz, com o qual acreditava que iria ficar com ele para sempre. Prometi-lhe isso e agora não posso voltar atrás. Há dois meses, fomos de férias para o Alentejo e ele parou o carro e prendeu-me a uma árvore. Deixou-me lá três dias. Ao primeiro dia não sabia onde estava, tentava-me libertar, mas não conseguia. Ao segundo, desisti, passei todo o dia e toda a noite a olhar para o céu. Ao terceiro, ele finalmente veio-me buscar. Foi assim que fiquei controlada por ele.
      Sendo eu uma criança na altura, não me apercebi do quão forte aquelas palavras tinham sido, não parava de olhar para ela, uma mulher tão forte, tinha resistido aos abusos do namorado, e que agora não conseguia fugir.
     Minha mãe estava-me a observar de longe, via-se na cara dela que estava zangada, por isso fui ter com ela, que me disse para me afastar daquela mulher.
      Acho que aquele semblante se foi embora logo a sair, para nunca mais ouvir falar dela.
  A minha mãe disse-me que me telefonou no dia em que fiz 11 anos, e que se suicidou no dia a seguir. Nunca cheguei a saber o nome dela, e aparentemente nem a minha mãe. Parece que ninguém a conhecia, e no fundo, era a verdade.
Quem sou eu sem os Outros?
Ninguém, é apenas o meu ser
Sou apenas o Eu próprio

Se fosse como não sou
Meu corpo seria aceite
Minha alma imperfeita
Presa num corpo comum
Pertencente ao Mundo.

Porque existo?
Porque os outros assim o quiseram.
Não é que não o queira
Minha consciência presa é supérflua ao Outros
Mas imprescindível à minha essência.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Mamã, Como Se Faz Um Bebé?

Aqui está um texto do 6º ano, para uma ficha de avaliação de ciências. Acho-o muito engraçado.

-Mamã, quero saber como se faz um bebé. – Perguntou a filha.
-Mas isso tu já sabes, os bebés vêm numa cegonha.
-Mas como é que eu sou parecida contigo e com o pai se a cegonha não vos conhecia? – Insistiu a filha.
-Ah! Vou-te explicar, mas vai ser um bocadinho difícil compreender.
Então é assim: Os humanos têm reprodução sexuada. Reprodução sexuada é quando se precisa de dois sexos diferentes para fazer um bebé, tal como eu e o pai.
O teu pai tem uma coisa chamada pénis; do pénis saiem os espermatozóides, que, imagina que são pequenos homenzinhos com cauda; os espermatozóides são feitos numas “bolinhas” que estão ao pé do pénis, que se chamam testículos.
-Mãe, tenho uma pergunta, o que é um “pénis”?
-Olha, um “pénis” é o que tu chamas de “pilinha”.
Eu tenho outros saquinhos que se parecem com umas nozes, que se chamam ovários. Os meus ovários, todos os meses deitam uma célula, que é um óvulo, e esse acto chama-se ovulação. A “pilinha” do teu pai entra na minha vagina, ou como tu lhe chamas, “pipi”, e lá larga os homenzinhos com cauda. Eles nadam até às trompas de Falópio…
-Trombas de quê?
-Trompas de Falópio, que é um canal ao pé dos ovários e é para lá que os óvulos vão.
O espermatozóide nada até à trompa de Falópio e entra no óvulo, esse acto chama-se fecundação. A junção das duas células vai originar uma nova célula que se vai dividir em muitas partes, até ficar parecida com uma amora, que se chama mórula.
-E eu posso comer essa amora?
-Não, porque assim fico sem bebé!
A mórula vai descer pela trompa de Falópio até ao útero, que é uma grande pêra invertida e elástica, a mórula vai ficar pegada nas suas paredes, para não cair, esse acto chama-se nidação. E aí, o bebé vai ficar durante, aproximadamente nove meses. Nos primeiros três, chama-se embrião e depois, passa a chamar-se feto.
-Mas como é que o bebé se alimenta?
-O bebé tem uma ligação com a mãe, que é o cordão umbilical, que é o umbigo. O cordão umbilical tem ligação com a placenta, que é uma espécie de “árvore”, pois tem muitos “ramos”, e nesses “ramos” a mãe dá alimentos e oxigénio ao bebé.
-Mas como é que o bebé não tem frio?
-O bebé está protegido pelo saco amniótico e pelo liquido amniótico, que o mantém sempre à mesma temperatura.
Depois de nove meses, o bebé sai cá para fora no parto e depois…
-Mas se isso é assim para todas as pessoas, porque é que eu sou diferente do meu irmão?
-Isso chama-se dimorfismo sexual, que é o que separa os rapazes das raparigas pelas características físicas.
E é assim que se faz um bebé.
-Ena, tinhas razão, não percebi “patavina” do que disseste.

A Importância Dos Livros

O quotidiano dos jovens do século XXI passou a ser dormir-escola-computador-dormir e a leitura é quase inexistente no nosso dia-a-dia. Isto é meio caminho andado para a ignorância.
Os nossos antepassados passavam os dias passeando por jardins, fazendo soirées (ao estilo de Eça de Queirós), encontrando-se com amigos (não virtualmente) e principalmente dando muita importância à leitura e à musica, no geral, às Artes. E faziam eles muito bem, nao tinham cérebros pequeninos e ressequidos sem informação nenhuma.
Quando abrimos um livro, a primeira coisa que sentimos é o prazer de desfolhar as suas folhas virgens, ansiosa pelo toque. E imediatamente, tal como sereias encantadas, arrastam-nos para dentro delas, aprisionando-nos e calando-nos e a única coisa a fazer é ler. Um livro pode ser o que quiseres. Pode contar uma história de amor impossível entre vampiros, uma aventura de "cowboys" ou pode simplesmente ser um clássico, um livro passado de geração em geração, com uma boa lição de vida e com muita sabedoria para transmitir.
Um livro ensina-nos a sonhar e a ter uma imaginação mais fértil, e isso, acreditem ou não, ajuda a ultrapassar todas as adversidades de uma vida, tornando-a melhor e muito mais fácil de viver. Porque quando vivemos felizes e acreditamos que conseguimos fazer tudo o que sonhamos, conseguimos. Essa é sem dúvida a função de um livro.
Um livro é um amigo mais velho e maduro, que nos ensina a sonhar, a estudar, a ler e a escrever, porque quanto mais lemos, mais sabemos.
Depois de tudo isto, não vos apetece ler?

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

O Que Devo Ser Quando For Grande?

            Desde pequena que me confrontam com a típica pergunta: “Que queres ser quando fores grande?”. Não só para as crianças é uma pergunta difícil, como para os adultos também! Quantas vezes não se questionam eles como seria “se tudo fosse diferente” ou “como será daqui em diante?”. Como seria se tivessem seguido os seus sonhos, os mais românticos ou até os mais idiotas! Eles podem estar presos a uma maldita secretária oito horas por dia, quarenta horas por semana, sem amor pelo que fazem, mas que no final da semana recebem um bom salário, que minimize o inferno em que vivem.

            A essas pessoas digo que perderam a vida, as suas ambições e os seus sonhos, que não quero ser como elas, enfadadas da vida. “Quero viver!”, basta eu dizer. Tenho catorze anos e ainda sou criança e gosto de o ser, para não ligar às tolices que os adultos digam de como devo viver a minha vida, sou eu que a decido. Não me importarei de viver com o ordenado mínimo nacional, desde que seja fiel a mim própria e ao meu coração. Sim, pode soar a parvoíce, mas falo pela voz de milhares de estudantes que como eu, querem seguir o que realmente gostam de fazer. Professor de surf, chef de cozinha, psicóloga ou antropóloga; a vocês, os adultos do futuro, digo que já chega de ouvirmos os “sem esperança” dizendo que não há futuro nas coisas que realmente queremos fazer.

            Porque quando há paixão e empenho, conseguimos chegar longe; sempre desejei que no futuro vivesse feliz com o meu marido mais os meus três filhos (um rapaz, uma rapariga e um “acidente”) numa grande vivenda com uma floresta ao lado, onde poderia lá ir como um escape, porque sinto-me feliz quando estou em sintonia com a Natureza. Poderei não ter uma grande vivenda, mas só quero ser feliz… Serei feliz à mesma num pequeno apartamento, fazendo o que quero e o que gosto.

            Nos tempos medievais, as pessoas eram obrigadas a casarem com quem os pais quisessem. Isso mudou, e mudará também o preconceito de que os “sem esperança” têm por nós, de que não conseguimos pensar por nós próprios, que apenas eles sabem o que é o melhor. Pois eles estão enganados, por mais crianças e imaturos que sejamos, temos sonhos. Sonhos que começaram com um simples pensamento, um rápido devaneio na nossa mente, até que damos por nós obcecados com essa pequena ideia, e pensamos: “Porque não me apercebi disto antes?”. Falamos com os nossos colegas e professores, que nos aconselham e nos aplaudem por causa de uma ideia tão inovadora, e dizem-nos para continuarmos com esse sonho.

            Estudei muito sobre esse assunto e apliquei-me nas aulas, porque a minha paixão é tão grande, que acredito que com esforço, poderei ser ótima, senão mesmo a melhor, no que quero fazer. E finalmente ganho coragem para contar aos meus pais o meu sonho. A minha mãe compreendeu-me e apoiou-me, mesmo apesar de ser um sonho caro. O meu pai é uma mente conservadora (de ciências!), que recusou o que eu queria, o que não faz lá muito sentido, porque tudo o que aprendi, aprendi com ele. Percebo que possa ser um futuro sem riquezas nem luxos, mas o que não me falta é motivação.

            Tenho uma prima chamada Susana, de vinte e tal anos, que está no curso de medicina, e eu uma vez perguntei-lhe qual tinha sido o momento da sua vida em que se apercebeu de que o que realmente queria seguir era medicina, que esta era a sua verdadeira vocação. Ela riu-se e disse: “Olha, nem agora estou segura de que o é, nunca estive, mas invejo a paixão com que falas das certezas do teu futuro”. Se tenho uma paixão, tenho que a seguir! Se sinto que tenho uma vocação, não perco nada! E não é vergonha nenhuma dizer que não vou para política, advocacia ou ciência, porque se amo o que faço, quero mostrá-lo a todo o mundo, e quero que me reconheçam pelo que faço. Quero servir de modelo a outros miúdos que no futuro sintam a mesma paixão por assuntos inusitados, e ajudá-los a perceber que não estão sozinhos no mundo, que têm que seguir as suas paixões, e dizê-lo e incentivá-los da mesma maneira como os meus professores o fizeram!

Quando tinha cinco anos, queria ser pintora. Com sete queria ser bombeira. Com nove queria ser “famosa como a Lili Caneças”. Com dez queria ser antropóloga e até aos doze estive indecisa entre isso ou escritora. Tenho catorze anos, estou no nono ano, e estou decidida a ir para Letras, porque o que eu mais quero ser no mundo é jornalista de música.